Um apelo ao céu (28 de Junho de 2020)

Vinícius Barcellos
2 min readMar 23, 2021

Há dois meses atrás eu escrevia sobre as consequências do cerceamento de discursos que de algum modo quebrava as amarras do debate público e nadava contra a corrente politicamente correta. Cá estamos novamente, dessa vez bem representado pelo @turningpointbr. Permitam-me tecer uma breve adaptação deste texto com ares renovados de esperança.

A princípio, a mente humana foi transpassada de tal forma pela vontade de parecer sempre “descolado” de maneira a tornar-se inato ao debate público uma dicotomia na qual a intolerância ao oposto é profunda, e isto denota o ápice da famosa espiral do silêncio: a vergonha de se posicionar com medo do que terceiros irão pensar. Este lado da moeda dificilmente é visto, pois geralmente é invisível e se camufla quando o emissor adequa seu discurso à voz corrente temendo o isolamento para agradar determinados grupos ou até mesmo para ficar bem visto diante dos seus respectivos ciclos de amizade. Com isso, vozes são caladas por serem consideradas impróprias às vistas do debate em questão, isto é, quem ousa ferir os suprassumos da moral politicamente correta é automaticamente “cancelada” e execrada publicamente, ou seja, o debate é suprimido, a liberdade de expressão é aviltada indiretamente

No entanto, para resolver esse problema, lhe tivesse sido concedidas algumas horas para tirar dúvidas com o célebre filosofo inglês John Locke, o que perguntaria? Vamos viajar no seu “Segundo tratado sobre o governo civil”. Ele afirma que quando um povo ou um indivíduo isolado são privados de exercer seus direitos ou são submetidos ao arbítrio de um poder ilegítimo e não podem recorrer a nenhum juíz na terra, estes têm a liberdade para apelar ao céu quando acharem que a causa merece.

Lembrou do STF? Calma, não é esse o foco — apesar de verossímil. A espiral do silêncio é legitimada pois está no campo da ideias, da retórica argumentativa e dos discursos políticos sob égide da liberdade de expressão, mas por quê estávamos tão quietos se esse direito também abarca nós conservadores? Será que é hora de apelar ao céu, mr. Locke? Embora não possamos ser juízes da nossa própria causa, existe um direito respaldado por uma lei soberana acima de todas as leis positivas do homem que nos reserva a decisão única quando não se têm mais a quem recorrer: a liberdade. Talvez esse seja nosso apelo ao céu, “pois nenhum homem tem o poder de se submeter a outro ao ponto de dar a este outro a liberdade de destruí-lo”. Compreendi, mr. Locke, estamos no caminho certo.

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Vinícius Barcellos

Vinícius Barcellos, acadêmico de Administração Pública da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Falaremos daquilo que te incomoda.